Henrique Prata: Garth Brooks é o maior exemplo de solidariedade da história de 50 anos do Hospital
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Henrique Prata: Garth Brooks é o maior exemplo de solidariedade da história de 50 anos do Hospital
Henrique Prata: Garth Brooks é o maior exemplo de solidariedade da história de 50 anos do Hospital

O Barretão começa na próxima quinta-feira, dia 20, e as postagens especiais sobre a Festa começam hoje. Segue abaixo uma entrevista com Henrique Prata, diretor do Hospital de Câncer de Barretos, responsável pela vinda de Garth Brooks ao Brasil.

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Em 2009, a Veja publicou uma matéria com Henrique Prata com o título “O chato do hospital”. De acordo com o próprio Prata, era dessa forma que diversos políticos o enxergavam, já que quando ele aparecia em Brasília, todos sabiam que era para pedir dinheiro.

Antes de entrar em qualquer assunto, vale um dado que ajuda a compreender o trabalho dele: o Hospital de Câncer de Barretos custa, por mês, 27 milhões de reais. Do governo, a instituição recebe 15 milhões. O que fica faltando, 12 milhões, Henrique se vira para arrumar. Atualmente, o Hospital realiza mais de 4 mil atendimentos por dia.

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Conheço o Henrique desde 2008, pouco tempo depois de começar a trabalhar com música sertaneja. Ele sempre aparecia “do nada” nos camarins, com uma série de pessoas o acompanhando, e tudo que estava acontecendo era interrompido. Entrevistas, atendimento aos fãs, qualquer coisa parava no meio para que Henrique e sua trupe entrasse.

Raramente, algum assunto pessoal era abordado. Era só “Hospital, Hospital, Hospital”. Ele divulga tanto os méritos do Hospital que, muitas vezes, nem precisa pedir dinheiro. Na música sertaneja, é difícil encontrar alguém que não tenha doado algum show ou ao menos esteja na fila para doar. No entanto, ser chamado de “pidão” não o incomoda. Ele até dá risada.

Em 1962, o oncologista Paulo Prata, pai de Henrique, assumiu um hospital na cidade de Barretos chamado “São Judas Tadeu”. No intuito de ajudar o número crescente de pacientes que viajavam de longe para tratar de câncer, criou, em 1967, a “Fundação Pio XXII”, que seria responsável por assegurar o funcionamento do Hospital, que passava a ser beneficente e exclusivo para o tratamento de câncer.

Em 1989, sob dívidas, o Hospital foi assumido por Henrique, que tinha o intuito de quitar os débitos e, posteriormente, encerrar as atividades. A proximidade com o trabalho feito pelo Hospital fez com que Prata, já bem sucedido em seu trabalho na pecuária, desistisse de fechar as portas e começasse a correr atrás de uma maneira de viabilizar o negócio.

Após pedir doações de 10 mil dólares a 40 amigos, começou sua história de batalha para construir o maior centro de tratamento câncer do país.

Viajei com Henrique Prata para New Orleans, Estados Unidos, no mês passado, para uma entrevista com o cantor Garth Brooks, que se apresentará, por conta de um  pedido de Prata, no próximo sábado (22), na Festa de Barretos.

Após conversarmos com Garth Brooks, saímos da sala de entrevistas e sentamos em uma mureta dentro do Ginásio no qual seria realizado o show daquela noite. Fiz a entrevista ali mesmo. Ele já estava um tanto emocionado por ver que o sonho de levar Garth ao Brasil estava se tornando real. Com o bate-papo, ele acabou se emocionando mais ainda.

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O papo vale a pena.

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-Muita gente brinca dizendo que você é chato. Eu te conheci invadindo camarins para falar do Hospital, e essa é a imagem que boa parte das pessoas tem de você. Em algum momento da sua vida isso te incomodou?

Eu acho engraçado, é isso mesmo que eu faço. Você me fez lembrar o primeiro momento que eu resolvi fazer as coisas… até mexeu comigo, tô até emocionado. Eu resolvi numa noite que eu ia fechar o hospital, mas na manhã seguinte acordei e resolvi que ia construir um novo. Meu pai até ficou assustado com isso, e eu disse: “ontem eu não tinha amor que tenho hoje. Ontem eu não tinha jurado pra Deus que eu ia me humilhar pra ajudar os outros”.

Eu nunca precisei desse tipo de ajuda, mas sei que muitos precisam. Sei da miséria desse país, sei como abandonaram o Norte e Nordeste, morro de pena que as pessoas tenham que andar 4 mil quilômetros pra chegar até aqui. Quando o cara é rico, ele é atendido na hora. Não pode ser assim.

Quando você acha que tem que viver no seu mundo, no seu egoísmo, talvez você não tenha essa força todos os dias. Faz 28 anos que eu acordo cedo sabendo que vou me humilhar pra alguém quantas vezes for preciso, vou furar fila, vou pular no peito de alguém pra pedir. A essência do meu trabalho é essa, não ter vergonha de me humilhar.

-Nós vivemos uma época em que as pessoas estão desacreditando cada vez mais nas instituições públicas, principalmente com questões de enriquecimento ilícito. Com o tanto de dinheiro que você mexe, nunca aconteceu de alguém desconfiar de você ou ir atrás para procurar alguma coisa?

Não, não tem isso… deixa eu te falar… eu peguei um hospital de dois mil metros quadrados, e no prazo de 25 anos, construí 150 mil metros quadrados. As pessoas enxergam claramente a obra. É um dinheiro sofrido, catado em leilões, em doações. A obra fala por si, os balanços falam por si. É tudo aberto, transparente. Eu saí de um hospital com 60 colaboradores e hoje tenho 4 mil. Eu tinha 16 médicos, hoje tenho 500.

O hospital custa por mês 27 milhões de reais, e o governo paga 15. Não tem como administrar uma obra como essa sem você ter consciência, sem ser honesto. O povo do sertanejo, o povo que tem dinheiro e que me ajuda, sabe do meu trabalho, vê meu trabalho. Nada responde mais a essa pergunta do que conhecer a obra.

-É muito forte a relação do Hospital com os artistas sertanejos. Qual é a importância dessa proximidade entre vocês?

Nós conseguimos uns 6 milhões de reais por ano só em shows, não só com os sertanejos, mas principalmente com eles. Não conseguimos usar todos os artistas que nos oferecem shows, mas usamos o máximo possível. Nós temos umas 20 cidades parceiras que fazem show pro Hospital. A cidade pede um artista, eu faço a ponte e a gente arrecada pro Hospital. Teve artista que já fez três shows pro Hospital em um ano só. O Alexandre Pires já fez isso, o Leonardo já fez isso.

Só pra te contar uma história de comprometimento com o projeto, em 1997, eu tava com uma dívida de um milhão e duzentos mil dólares. O Leandro e o Leonardo chegaram pra mim e disseram: “vamos te dar um presente”. Me deram o show “Amigos”, que eles só faziam pra Globo, e aquilo pagou minha dívida. O Leandro me dizia: “você não pode ter essa dívida, o Hospital não pode ter esse déficit, a gente vai te ajudar”. O Leandro teve mais fé que eu. Ele me dizia que os 35 mil metros que eu tinha naquele momento eram pouco. Dizia que era pequeno e que eu poderia chegar muito mais longe. Já estamos nos 150 mil metros.

-O Garth foi mais uma “vítima” dos seus pedidos. Como foi a aproximação com ele?

O Garth me surpreendeu mais que todos. Eu já havia o procurado anos atrás, mas ele tinha um contrato com o Wynn, hotel em Las Vegas, e me pediu pra eu procurá-lo quando o contrato acabasse.

Fiz o que ele pediu, propus o show pra ele, e de cara já arrumei dois aviões emprestados, de amigos, pra que ele pudesse tocar em Barretos. Ele disse que “tudo bem”, topou fazer o show, e disse que ia pensar um pouco antes de a gente fechar de vez. Passou um tempo e ele mandou um recado pra mim: “avisa meu irmão que no dia em que eu ajudo, ele não vai dever favor pra ninguém”.

Resumo da história: ele tá viajando dos Estados Unidos pra Barretos no avião dele, bancando 2 milhões de reais do próprio bolso. Até a água da equipe vai sair do bolso dele. Ele não quer que eu deva favor pra ninguém.

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Esse é o homem mais próximo de Deus que eu conheci. Tenho expectativa de uma renda acima de 10 milhões. Acho que nunca mais vamos ver um exemplo como esse, de um cara sair de onde ele mora, viajar pro Brasil só pra ajudar, pra doar. É o maior exemplo de solidariedade da história de 50 anos desse hospital.

-Na ocasião da morte do Cristiano Araújo, você declarou à Folha que ele já havia doado mais de 2 milhões de reais ao Hospital. Houve quem duvidasse dos números…

Bobagem, é só fazer as contas. Os primeiros shows dele pro Hospital deram mais de 500 mil de renda. O Hospital tinha uma relação boa com ele, tinha todo um apelo dele e do Hospital na hora dos shows, então o resultado sempre foi positivo. O que eu disse na ocasião é que como ele fez três shows pra gente, ao menos um milhão e meio nós conseguimos na soma. Como ele também participou de outros projetos do Hospital em parceria de outros artistas, somando tudo eu acredito que superamos 2 milhões de reais. Foi uma grande parceiro nosso.

-No Brasil, o problema da saúde é falta de dinheiro ou falta de administração?

Não, não… não é dinheiro, é gestão. É saber fazer o que é certo. Você ouve notícia de que um prefeito dá uma secretária de saúde pra um açougueiro que é amigo dele, dá pra alguém que quer se eleger vereador, dá pra alguém que quer apenas se beneficiar de alguma maneira, desse jeito não vai dar certo mesmo. É preciso honestidade e amor pelas pessoas pra comandar algo assim, e você não vê isso. Eu sigo uma regra: só devem administrar um hospital pessoas pessoas que amam pessoas. Não é lugar pra brincar ou pra se projetar politicamente, e esse é o maior pecado de todos.