Fernando Fakri de Assis, 32 anos, paulistano.
Integrante de uma das principais duplas sertanejas da nova geração, Sorocaba está lançando seu novo CD ao lado do parceiro Fernando, mas este assunto vai ficar para outra hora.
Como a série de entrevistas ouve figuras importantes dos bastidores, o papo com Sorocaba é sobre mercado, negócios, concorrência e futuro da música sertaneja.
Sócio da “FS Produções Artísticas” (FSPA), da editora JKF, e do cantor Luan Santana, Sorocaba administra de perto as carreiras de 2 duplas, um cantor solo e um grupo de Samba. De quebra, é o compositor que mais arrecadou com direitos autorais no Brasil em 2011 e 2012.
Abaixo, a conversa que tive com ele.
*Fotos: Cadu Fernandes
Como surgiu a ideia de abrir o escritório? Qual o tamanho dele atualmente?
O escritório começou por causa da procura que havia por shows da dupla. Havia datas especiais muito procuradas, como feriados por exemplo, e a gente viu que precisava dar outra opção aos contratantes. ‘Fernando e Sorocaba não estão disponíveis pra esse dia, mas tenho outra dupla pra te atender’. A abertura do escritório veio justamente disso. Hoje ele tem um tamanho razoavelmente bom, temos mais quatro artistas de grande importância, Marcos e Belutti, Thaeme e Thiago, Lucas Lucco e o Inimigos da HP, grupo de samba. Há mais nomes em negociação, mas ainda não posso adiantar quais são.
Há espaço para novos artistas?
A gente sempre tá interessado em artistas bons, todo escritório está. Artistas que fazem coisas iguais é o que mais tem, isso já não nos interessa. O que interessa é o que eu gosto de chamar de ‘artistas conceituais’, que trazem novas ideias, novas propostas, novos ares. Quem não queria achar um Luan Santana, que trouxe uma quantidade imensa de jovens pro sertanejo? Quem não queria um Victor e Leo, que trouxe um público que curtia MPB pro sertanejo? Todo mundo quer. O escritório, como eu disse, já está com um tamanho razoavelmente bom, mas artistas diferentes sempre terão portas abertas.
Você fala sempre de “artistas com diferencial”. Qual é a principal virtude da sua dupla?
Acho que uma dos principais virtudes da dupla está nas nossas apresentações durante as turnês. Fernando e Sorocaba já se consolidou como uma uma dupla que aposta na inovação. A gente sempre gostou de levar outros tipos de entretenimento aos palcos além da boa música, usando uma pitada de tecnologia, mágica, movimentação e etc. Gostamos de surpreender as pessoas e isso já virou uma marca da dupla.
Pra você ter uma ideia, na nova turnê, o baterista e o sanfoneiro ficam dentro de cúpulas, em plataformas elevatórias fora do palco, no meio do público. Além do fato de a gente trabalhar com a mobilidade de painéis de LED e outras coisas. Bom entretenimento é o nosso lema.
O Fernando é um segunda voz tão presente quanto o primeira voz. No início da carreira, no entanto, ele não tinha tanto destaque como agora. É também uma estratégia ou ele tomou o espaço dele naturalmente? Esse também seria um diferencial?
Ele ganhou o espaço dele, foi muito natural. Ele é um cara diferente. Desde o primeiro show que eu fiz com ele, praticamente 6 anos atrás, eu sabia que precisaríamos explorá-lo muito no futuro. Sabia que ele era ótimo no piano e na guitarra, mas no começo não havia espaço pra isso no show. O tempo foi mostrando quem ele era, e hoje ele tem no currículo a produção dos últimos CD’s do Luan Santana e do Chitãozinho e Xororó. Eu defendo tanto que a gente precisa de artistas diferentes, e ele é justamente um deles. Ele agrega muito, não é apenas mais um. Ele tem muita carta na manga, vai surpreender muita gente ainda.
A FSPA e a Audiomix/JeM são os dois principais escritórios do mercado atualmente. Você os vê como seus principais concorrentes?
Não sei se a palavra “concorrente” define bem, talvez passe uma ideia errada. São os 2 mais representativos hoje, mas há outros importantes também. Eu não gosto de falar em concorrência por poder passar algo negativo, a variedade é extremamente necessária. Essa espécie de “disputa” é sadia pro mercado, quando é feita de forma honesta. Já imaginou se não houvesse o nosso ou não houvesse o deles, se existisse um monopólio? Existindo frentes diferentes, fica aquela necessidade de sempre tentar algo novo, querer crescer, querer ser melhor, e quem ganha com isso, no final das contas, é o sertanejo.
Você tem um discurso muito positivo nas suas entrevistas. Por mais que a gente saiba da existência de eventuais problemas nos bastidores, suas declarações passam uma impressão de que tudo está sempre andando bem…
Na verdade não é que o discurso seja positivo, é que algumas pessoas tem uma ideia errada de como funcionam as coisas. Acho que muita gente ainda tem que entender que um bom momento do Luan Santana reflete positivamente pra mim. Um bom momento do Gusttavo Lima também é bom pro Fernando e Sorocaba. Quem confia e se garante no seu trabalho, não pode achar o sucesso alheio algo ruim. Pra mim, quanto mais gente boa fizer sucesso, mais o mercado vai expandir, e eu me aproveito dessa maior abertura. Vai haver mais festas, mais eventos, mais procura por shows, e isso reflete a todos. Se eu fizer minha parte, Victor e Leo fizerem a deles, Michel fizer a dele, Jorge e Mateus fizerem a deles, só vai ser bom. Isso é algo que eu acho importante que as pessoas entendam, e muita gente eu sei que não enxerga assim.
Poucos meses após você decidir investir no Luan Santana, ele virou sucesso nacional e se tornou maior que a dupla Fernando e Sorocaba, que ainda estava num processo de crescimento. Muitos te perguntaram se isso te incomodou, mas pelo jeito, o seu raciocínio então é de isso foi positivo pra você também…
É isso… Essa foi uma pergunta que me fizeram muito na época em que ele estourou, e geralmente vinha acompanhada de uma outra pergunta: por que você passou ‘Meteoro’ pra ele e não gravou? Começando pela segunda, é porque a música tinha o perfil dele. O Luan tem o tipo dele, a forma de cantar dele, tinha um público muito bem definido, então aquela música se encaixava perfeitamente nele. Se alguém gravasse e não tivesse esse perfil, provavelmente não chegaria perto do sucesso que ele conseguiu.
Sobre o fato de ele ter se tornado maior que a dupla na época, longe de ter sido um problema. Como eu te disse, eu sempre pensei no segmento ‘música sertaneja’ como um todo, e o Luan agregou muito, trouxe um público muito grande pro sertanejo, ajudou a expandir o mercado. Quantos jovens não foram apresentados ao sertanejo através do Luan Santana, depois conheceram Fernando e Sorocaba, Jorge e Mateus, Victor e Leo, até Chitãozinho e Xororó e até Tião Carreiro e Pardinho? Por isso que a palavra “concorrência” às vezes pode passar uma impressão errada. É claro que você quer ser o maior, mas o sucesso alheio muitas vezes é muito positivo para os outros artistas.
O fim de um contrato entre artista e empresário invariavelmente dá problema e, muitas vezes, uma repercussão pública negativa. Como você vê o problema?
Eu acho que é necessário que se crie rapidamente alguma norma ou alguma lei que regulamente essa relação entre escritórios e artistas. Vivemos em um meio muito profissional, muito sério, mas que esbarra às vezes nessa questão. É preciso que fique claro direitos de ambos os lados, que haja uma segurança na hora em que se assina um contrato, assim como acontece no futebol. Os escritórios precisam se unir nessa situação, pois ela é não é boa pra ninguém. Isso desestimula o investimento em cultura e arte no Brasil, pois falando de forma racional, você não sabe até quando determinado artista vai estar com você, então vai ficando difícil a decisão de se investir nele. Não estou citando nenhum caso específico ou falando desse ou daquele artista, mas sim da questão em geral. É um problema que existe e que precisamos resolver.
Quem te acompanha pela internet, tem a impressão de que você está sempre trabalhando. Quando não está no escritório, está em estúdio. E quando faz o já tradicional churrasco na sua casa, sempre tem gente do meio junto ou alguém da sua turma de compositores…
É isso. Esse é o Sorocaba. Eu gosto muito do que eu faço, hobby e trabalho acabam se misturando. Eu gosto muito disso, meu trabalho é muito prazeroso pra mim. Eu sou incansável atrás de procurar uma música que seja popular e que tenha um diferencial, vivo 24 horas em função de música, é como se eu trabalhasse 24 horas por dia. Eu e o Fernando, assim como todo o escritório, gostamos de por a mão na massa. Acho que esse é um dos grandes motivos do nosso sucesso.
Você é sócio do escritório, sócio de uma editora, compositor, cantor, empresário de outros artistas, além de ter seus negócios fora da música. Não houve nenhum momento em que você parou pra pensar e percebeu que era hora de se preocupar mais apenas com a própria carreira musical?
Poxa, não tive isso ainda não, graças a Deus. Acredito que sempre consegui administrar muito bem. Costumo dizer que uma carreira estabilizada tem vários pilares que a sustentam, por isso eu me dedico a todos os aspectos da carreira. Um pilar é o repertório, talvez o principal. Temos a vantagem de nosso trabalho ser muito autoral, ter a nossa cara, estar dentro do nosso controle. Outro pilar é o show, no qual a gente investe muito e pelo qual temos sido elogiados há anos. O terceiro pilar é o escritório, o trabalho feito por trás dos palcos, as estratégias pensadas pra manter a carreira do artista. Se você tem esses três aspectos bem formados, quando um deles não vai tão bem, o outro ajuda a segurar, equilibrar as coisas.
É verdade que nós trabalhamos hoje com muito gás, com o acelerador no talo, e não sei se é possível manter esse nível por anos e anos. Mas hoje eu tenho 32 anos, sou solteiro, tenho meu tempo todo pra música, então eu trabalho no limite pra conseguir os melhores resultados possíveis.
Você foi o profissional que mais arrecadou com direitos autorais em 2011 e 2012. Além da questão do talento, que todo compositor precisa ter, há algo a mais no seu processo de composição? Alguma estratégia, alguma preocupação, um raciocínio mais frio, mais calculado?
Não é um raciocínio frio não, eu considero algo caloroso. Minha forma de compor é engraçada. Tem vezes que parece que baixa uma coisa e em 15 minutos sai uma música. ‘Paga Pau’ foi assim, ‘Meteoro’ foi assim, saíram em 15 minutos, tudo de uma vez. Já ‘Madri’, por exemplo, eu levei meses pra terminar. Não há uma fórmula ou um segredo, mas eu acho que se há uma recomendação, é de que o compositor busque sempre tentar ser popular, pois a música sertaneja é popular e nunca vai deixar de ser. E ser popular não é ser bobo, falar qualquer coisa, qualquer besteira. Esse equilíbrio é o grande negócio.
Meu segredo como compositor é ter conseguido desenvolver esse filtro popular, eu não nasci sabendo. Minhas primeiras composições eram bobinhas demais, depois passei a pirar demais e errar a mão. Levou tempo pra me ajustar e desenvolver essa espécie de controle. Os acertos vem quando esse processo deixa de ser racional e passa a ser natural.
O dinheiro dos direitos autorais vem principalmente de onde? Da dupla ou das músicas gravadas pelo Luan Santana?
O grosso mesmo vem do Fernando e Sorocaba. Uns 90% pelo menos do que a gente grava e canta nos shows são coisas nossas. O show é muito autoral, então a fonte principal é a própria dupla. É fato que o Luan tem um papel importantíssimo nessa história, já que grandes sucessos dele são composições minhas e elas tocam muito até hoje, em rádios e em shows. Mas nossos shows e CD’s pesam muito, o fato de serem autorais é o que me fez chegar nesse primeiro lugar.
Muitos artistas da nova geração, no início da carreira, focaram suas estratégias de divulgação na distribuição de CD’s promocionais, inclusive você. Pelo que já ouvi você dizer, essa prática é coisa do passado?
Essa foi uma estratégia que deu muito certo e foi muito importante, mas na minha opinião, já passou. Eu já não acredito que seja uma boa estratégia pra 2013. Eu vejo muita gente olhando pra trás buscando referências, mas não estão percebendo que nosso segmento está mudando as estratégias muito rapidamente.
Hoje nosso escritório é muito mais voltado pro digital, acompanhamento do iTunes, YouTube, redes sociais, novas oportunidades. Com uma estrutura digital bem equipada, como é a nossa, o escritório tem muito mais força do que se distribuísse CD na mão das pessoas. Claro que os promocionais continuam aí, nas campanhas de rádio, em alguma premiação em show, alguma divulgação pontual, mas a grosso modo, quem estiver voltado pro digital vai ter mais sucesso.
Você ganha muito com direitos autorais, mas não condena quem baixa suas músicas de graça. Como funciona essa quase “contradição” na sua cabeça?
Cara… complicada a pergunta… preciso parar e pensar, mas de fato é um dilema que eu vivo. Eu não fico julgando o que as pessoas fazem na internet, apesar de eu preferir, claro, receber pelas músicas. O que eu acho é que estamos em uma fase de transição e que soluções vão aparecer com o tempo. O iTunes apareceu como uma alternativa boa, que vende música a 99 cents. É um exemplo, uma ideia, mas há muita gente se mexendo pra que todos possam ganhar e aproveitar os benefícios da internet. Eu realmente não consigo te responder da forma que eu gostaria, pois estamos todos nos acostumando com um cenário novo. O que eu acho importante é que todo mundo possa receber por seu trabalho.
Qual sua relação e sua opinião a respeito do ECAD?
Minha relação é boa, e eu acredito que ainda não exista uma solução melhor que o ECAD, mas sou aberto a discussões e propostas novas. Acho que essa questão de direitos autorais precisa ser resolvida logo, pois há centenas de compositores que precisam receber de forma justa e rápida, já que dependem disso pra viver. Eu tenho muita curiosidade em saber como funciona essa questão nos Estados Unidos e na Europa. Não apenas o que diz a lei, mas como se consegue fiscalizar de forma eficaz e justa. Que eu saiba, não há essa briga imensa em outros países, é uma coisa muito nossa. Acho que a gente não pode fechar os olhos pra ideias novas, como muitos fazem. Eu mesmo conheço um projeto novo que vai monitorar a execução de músicas em rádios de forma extremamente confiável. A gente tem que estar de olho em propostas novas justamente porque é de nosso interesse.
Você é um otimista em relação ao futuro do sertanejo, não prevê a queda que muitos profissionais comentam…
Eu acredito que nos próximos anos, quem investir em entretenimento de qualidade, vai se dar bem. O sertanejo é, sem sombra de dúvidas, o gênero que mais está trazendo bom entretenimento pra esse país. O sertanejo está disparado na frente dos outros estilos, muito a frente do segundo. Na minha visão, ele vai permanecer em nível muito alto, e vai ser a principal música do Brasil ainda por muitos anos. Acredito também que o nível de exigência do povo vai aumentar, e as duplas e as festas terão que acompanhar esse desejo por coisas melhores. Não vejo a queda que algumas pessoas preveem. É claro que há uma variação entre artistas, uns caem, novos surgem, mas o mercado de entretenimento sertanejo vai seguir em alta.
___
A série “Bastidores”, publicada toda segunda-feira, já teve outros quatro entrevistados:
-Dudu Borges, produtor musical
-Arleyde Caldi, assessora de imprensa de Zezé di Camargo e Luciano há 21 anos e de Luan Santana
-Marcelo Siqueira, diretor artístico da Nativa FM
-Charles Bonissoni, sócio-fundador da Wood’s
___
*O sistema de comentários do blog está passando por uma mudança, então praticamente todos os posts estão sem nenhum comentário. Os comentários não foram apagados, apenas não estão visíveis durante a mudança. Logo estarão de volta.